domingo, 24 de janeiro de 2010

Pai é bom demais

Aqui, de vez em quando, conto uma história do meu filho Guilherme, mas pouco falo do filho Inácio, apesar de já ter reproduzindo uma incrível carta do meu pai pra mim. Hoje trago um belo artigo do Luciano Siqueira, um cabra que à gente não carece esforço algum pra gostar dele, publicado no potal Vermelho e em seu blog. Fala do convívio com seu pai, de momentos inesquecíveis da vida. Hoje estou domingando com o meu filhote e estamos compartilhando doces momentos de lazer, de prosa e desse convívio delicioso entre pai e filho. Obrigado, Luciano, pela emoção que nunca devemos deixar escapulir de nossas vidas.

Em Ponta Negra e no bar da Rua Chile

Aconteceu poucas vezes. Inesquecíveis, todas. Ele nos levava de ônibus da Lagoa Seca, onde morávamos, até Ponta Negra, que na segunda metade dos anos cinquenta era uma praia distante. Numa parte íngreme havia um varal com calções e maiôs para aluguel, anunciados numa placa tosca, e um quadrilátero de palha para que o freguês trocasse a roupa.

O banho nós – eu e Airton, o irmão mais novo – tomávamos no rasinho, envoltos na espuma espessa e abundante que nos proporcionava fantásticas aventuras imaginárias em alto mar.

Havia uma breve pausa para o lanche: pão creoulo torrado com leite de coco, trazido de casa, e refrigerante. Uma delícia! E ao final da manhã, no retorno para casa, ele nos levava a um bar da rua Chile, na Ribeira. E era ali, no bar, que invariavelmente me vinham as imagens de uma visita ao prédio central da Alfândega, num meio de semana, pela manhã, a que ele me levara. Um prédio imenso ao meu olhar de menino, gente entrando e saindo, um carneiro bem alvo preso a uma corda no pátio interno (pertencente a algum funcionário, suponho). Apertos de mão e abraços efusivos. - Olá, Renato, tudo em ordem? E esse rapazinho? - Meu filho, é o penúltimo da turma, encostado no caçula. Gosta muito de estudar.

Lembro de ter experimentado orgulho do pai respeitado e querido por muita gente, seus colegas de repartição.


No bar ele pedia uma cerveja Caracu – cerveja preta fazia bem à saúde, dizia – e guaraná Antarctica para nós dois. Num prato pequeno, queijo de coalho cortado em cubos, untado em molho inglês.


Não me recordo se ele conversava com a gente. Nem que coisas de crianças dizíamos um ao outro. Nem se demorávamos ou não no bar. Sei apenas que me sentia importante naquele ambiente frequentado por homens, onde eu era um deles, sentado à mesa redonda de mármore branco e pés de ferro. Um prazer tão imenso que ainda hoje quando vou a Natal dou um jeito de passar na Chile, no velho bairro da Ribeira, e já nem sei quantas vezes voltei à Ponta Negra (para afogar os pés na espuma da praia defronte ao morro do Careca), hoje modernamente urbanizada, muitos hotéis de luxo, turistas por toda parte.


A praia de Ponta Negra e a rua Chile me transportam à infância e afloram um quê de tristeza por tê-lo perdido tão cedo (faleceu precocemente quando eu tinha 11 anos) e por não ter conseguido lhe dizer o quanto me fazia feliz naquelas esporádicas, mas fascinantes manhãs de domingo.