A palavra algema vem do árabe al-djama’a, que significa “pulseira” e eu sei o que é usar uma. Lógico que num fui atrás de saber se ficava mais elegante usando aquelas pulseiras com travas, mas usei sim, mais de uma vez. Também num foi numa experiência “sadomasô”, numa orgia sexual. Foi por conta duma prisão mesmo, nos meus tempos de militante do movimento estudantil.
Num digo isso aqui pra contar vantagens, até por que num vejo nenhuma. Esse episódio vai completar 22 anos no final desse mês e acabou gerando um livro (por sinal muito incompleto) editado pela Editora Alfa-Omega. Na época os estudantes invadiram a Assessoria de Segurança e Informação – ASI, que funcionava numa sala do prédio da Reitoria da UFC, quase embaixo do gabinete do Reitor, na época o professor Anchieta Esmeraldo.
A coisa deu um rebuliço danado porque foi revelada uma atividade ainda grande da repugnante “comunidade de informação” do regime militar em plena Nova República, que já tinha mais de um ano. O Brasil vivia uma espécie de lua de mel com a democracia. Os partidos clandestinos e as entidades estudantis conquistaram a legalidade, houve eleições diretas nas capitais em 1985, foi convocada a Constituinte eleita em 1986, etc e tal.
Dois dias depois da invasão, eu tava na sede do DCE com outros estudantes quando a polícia federal entrou de metralhadora na mão e prendeu duas diretoras da entidade, Martinha e Liduína, e eu. Saímos algemados, uns nos outros, pra que não fugíssemos, e ainda ameaçaram nos colocar na carroceria de um carro que levava os documentos apreendidos, numa atitude típica de execração pública, mas não chegaram a tanto. Lembro que, diante duma multidão que se aglomerou na rua, ergui o pulso algemado no pulso da Lidú e gritei bem alto: “ - Olhe gente, é isso que eles fazem com quem luta pela democracia”. No percurso até a prisão um policial nos ameaçava com um daqueles perfuradores de côco, dizendo pra outro: “ - Rapaz, um bicho desse aqui enfiado na esta dum baderneiro deve doer, né?”.
Na sede da PF fomos mantidos detrás das grades, apenas com as tais roupas íntimas, e ainda tive que aturar um “psicólogo” tentando me convencer de que a nossa semi-nudez era uma rotina porque havia casos em que presos que se suicidavam usando as próprias roupas. Foi inevitável a lembrança dos “suicídios” de presos políticos na ditadura. Dei uma gargalhada e disse pro picareta lá: “ - Pois se for por isso, pode trazer minha roupa de volta”.
Saímos das celas pelo menos umas duas vezes e sempre algemados. Numa delas fomos depor e “tocar piano”. Depois fomos para os presídios, eu pro Olavo Oliveira e as meninas pro Auri Moura Costa, que na época funcionava no bairro Jacarecanga, ali perto do Liceu do Ceará, e novamente as algemas enfeitaram nossos pulsos. A “minha” ainda deu trabalho pra abrir lá no presídio e teve que ser arrebentada num torno. Voltei a usar as “pulseiras” no dia seguinte quando fui solto graças ação de advogados como o meu camarada Benedito Bizerril e ao então presidente da OAB, Silvio Brás, mas também às centenas de estudantes que permaneceram acampados por mais de 24 horas em frente à sede da PF.
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